Rússia reconhece rebeldes como autoridade legítima da Líbia

01/09/2011 09:49

O governo russo reconheceu de forma oficial o CNT (Conselho Nacional de Transição) da Líbia como autoridade legítima no país, declarou, em um comunicado divulgado nesta quinta-feira (1º), o Ministério das Relações Exteriores da Rússia.

- A Federação Russa reconhece o Conselho Nacional de Transição da Líbia como a autoridade do país e destaca seu programa de reformas, que prevê o desenvolvimento de uma nova Constituição, a realização de eleições gerais e a formação de governo.

A Rússia lembra que suas relações diplomáticas com a Líbia "nunca foram interrompidas" desde seu estabelecimento, em 4 de setembro de 1955, "independentemente do Governo que havia em Trípoli".

A Rússia diz esperar que o CNT respeite todos os acordos e contratos assinados entre os dois países durante o regime de Muammar Gaddafi.

- Confiamos que os acordos e outras obrigações mútuas estipuladas entre a Federação Russa e a Líbia anteriormente seguirão em vigor e continuarão a ser cumpridos.

A Rússia participará nesta quinta-feira da conferência que realizará em Paris o Grupo de Contato da Líbia para tratar da situação no país africano.Outros países da Europa e mesmo os Estados Unidos já reconheceram o CNT (Conselho Nacional de Transição) como a nova autoridade na Líbia. No último dia 25, a Liga Árabe também reconheceu o CNT da Líbia como representante legítimo do país. O secretário geral da entidade, Nabil el Araby, disse que é hora da Líbia retomar seu assento permanente.

Sanções

No último dia 12, o presidente russo, Dmitri Medvedev, disse que seu governo começaria a implementar as sanções da ONU (Organização das Nações Unidas) contra a Líbia, adotadas em março, para proibir transações financeiras com o regime de Gaddafi.

O novo decreto proíbe que aviões líbios sobrevoem o espaço aéreo russo, a menos que transportem ajuda humanitária ou tenham a necessidade de fazer um pouso de emergência. Prevê também a proibição de transações financeiras com membros do regime e ligados a Gaddafi.

A Rússia se absteve de votar esta resolução, que permitiu o início do bombardeio aéreo de atuais potências ocidentais na Líbia para proteger a população civil. No entanto, Medvedev já havia assinado um decreto de aplicação das sanções da resolução da ONU de 1970, adotada em fevereiro com o apoio da Rússia.

 

Análise: Quem liderará a Líbia pós-Gaddafi?

O júbilo inicial em Benghazi, que virou a “capital rebelde” logo no início da ofensiva dos insurgentes contra o regime de Gaddafi na Líbia, deu lugar à ansiedade.

Os grupos contrários a Gaddafi reconhecem que a batalha ainda não está vencida e que ainda há combates à espera em Trípoli.

E há, também, o risco de caos caso um novo governo não preencha rapidamente o vácuo de poder deixado pelo regime anterior.

A expectativa é que a futura liderança da Líbia se forme a partir do atual Conselho de Transição Nacional (CTN), formado pelos rebeldes em Benghazi no início do levante.

Mas isso ainda deixa em aberto a questão de quem seria o novo líder líbio após 42 anos de supremacia do coronel Gaddafi.

Os olhos estão sobre o presidente do Conselho, Mustafa Abdul Jalil. Ex-ministro da Justiça, ele tem reputação de integridade e goza de prestígio tanto no leste quanto no oeste do país.

“Ele era o único que enfrentava Gaddafi [no governo], que, por sua vez, dizia “não”“, disse um morador de Benghazi.

Porém, Abdul Jalil ameaçou renunciar diversas vezes e ainda não está claro se ele de fato quer o trabalho.Entre os nomes recorrentes está o de Mahmoud Jibril, o chefe do Conselho Executivo, uma espécie de gabinete do CTN.

Jibril tem reputação de ser um competente tecnocrata, a quem caberiam muitas das decisões sobre o funcionamento do Conselho no dia-a-dia.

Seu colega Ali Tarhouni, também notório, retornou do exílio para se encarregar da função vital de encontrar financiamento para os rebeldes.

Também mencionado frequentemente é Shokri Ghanem, um ex-primeiro-ministro que impulsionou a liberalização da economia. Ele vive fora da Líbia e não faz parte do Conselho rebelde.

Se, e a partir do momento em que, Gaddafi realmente deixar o poder, as dificuldades de se implementar um novo governo começarão.

Saques generalizados, ataques de vendeta contra simpatizantes de Gaddafi e disputas fratricidas colocam potenciais obstáculos à ordem e à estabilidade do incipiente regime.

O próprio Conselho é uma colagem de diferentes facções - islâmicas, seculares, ex-membros do regime e exilados de longa data - com pouca coisa em comum além do desejo de derrubar Gaddafi.

O movimento rebelde representa também uma coalizão desconfortável entre representantes do leste e do oeste do país.

O assassinato do líder militar rebelde, general Abdul Fattah Younis, em julho, aparentemente por homens sob o seu comando, não foi esquecida.

O ato pode ter sido cometido por soldados leais a Gaddafi, militantes islâmicos ou líbios procurando vingança pelo fato de o general ter ocupado a pasta do Interior no governo de Gaddafi.

Vingança

Há divisões profundas e potencialmente perigosas dentro do movimento rebelde, hoje às portas do poder.

Os rebeldes que lutam em Trípoli estão mais próximos de um mosaico formado por diferentes milícias que de um exército unitário.

O desafio imediato da liderança política em Benghazi é evitar assassinatos de vendeta contra os simpatizantes de Gaddafi.

Tais ações poriam em risco o apoio dos países da aliança militar ocidental, a Otan, que colocou a vitória ao alcance dos rebeldes. Minariam, também, a legitimidade de qualquer novo incumbente.

Abdul Jalil afirmou que renunciará se seus comandantes não respeitarem o Estado de Direito - uma extraordinária admissão de que partes das Forças Armadas podem estar fora do controle político.

Nenhuma personalidade política carismática se destacou ainda como um tipo de figura capaz de disciplinar os elementos dissidentes do campo rebelde e curar as divisões no país.

Após quatro décadas de domínio do coronel Muammar Gaddafi, talvez os líbios achem que outro homem de mão firme seja exatamente do que precisam.

 

Relembre o que aconteceu no conflito mês a mês

FEVEREIRO - Os protestos na Líbia começaram no dia 16 de fevereiro inspirados nas manifestações que aconteciam no Egito e na Tunísia e que já se espalhavam por vários países no norte da África e no Oriente Médio. As manifestações surpreenderam, já que Gaddafi sempre proibiu qualquer tipo de revolta popular. O estopim para a revolta foi a prisão de um ativista pró-direitos humanos. A rede online de relacionamento, o Facebook, foi decisiva na mobilização. Neste primeiro mês as tropas pró-Gaddafi abriram fogo contra os manifestantes e diplomatas em vários países do mundo pediram intervenção internacional contra a onda de violência. Jornalistas e fotógrafos foram impedidos de entrar no país ou de divulgar fotos dos protestos. Imagem reproduz vídeo que mostra manifestantes destruindo monumento em homenagem a Gaddafi.

MARÇO - A revolta que pedia o fim da ditadura de Muammar Gaddafi provocou uma crise humanitária na Líbia. Segundo a agência de refugiados da ONU (Acnur), quase 150 mil pessoas cruzaram ou tentam cruzar as fronteiras para a Tunísia e o Egito, fugindo da violência no país. Enquanto isso, a revolução rolava solta nas ruas de várias cidades líbias. O reduto dos rebeldes contra-Gaddafi se concentrou em Benghazi, enquanto os pró-Gaddafi se concentraram em Trípoli, capital do país. A oposição reivindicava liberdades políticas, respeito aos direitos humanos e o fim da corrupção. A intervenção internacional gerou ainda mais tensões. Neste mês, mísseis foram lançados contra a mansão do Gaddafi e o ditador demorou a autorizar o acesso da Cruz Vermelha na Líbia. As tropas aliadas de Gaddafi lançaram uma ofensiva retomando várias cidades na região leste da Líbia, ameaçando Benghazi.

ABRIL - No terceiro mês de protestos, manifestantes disseram que 10 mil pessoas tinham sido mortas nas mãos dos soldados de Gaddafi, assim como 20 mil desaparecidos e 30 mil feridos, dos quais 7.000 corriam perigo de morte. A comunidade internacional concedeu apoio aos rebeldes, inclusive financeiro. Tropas da Otan bombardearam várias cidades do país tentando atingir tropas de Gaddafi e foi questionada pela morte de rebeldes e civis. Enquanto isso, a ONU pedia “cessar-fogo imediato”. Nesse mês vários acordos foram propostos entre Gaddafi e manifestantes, mas nenhum se consumou. Na foto, rebeldes rumam para o confronto com tropas de Gaddafi perto da cidade de Brega.

MAIO - Em maio, começam as especulações sobre o fim de Gaddafi. Alguns países, como os Estados Unidos aceitam pela primeira vez a legitimidade dos rebeldes, mas ainda não os admitem como governantes. A França expulsa diplomatas líbios aliados a Gaddafi, enquanto, o presidente venezuelano Hugo Chávez, que apoia o ditador líbio, classificou a ação da Otan de assassina. Na foto, rebeldes checam equipamento bélico em posto de controle próximo a Zintan, cidade a apenas 150 km da capital Trípoli

JUNHO - Os investigadores do TPI (Tribunal Penal Internacional) dizem ter provas de que o líder líbio, Muammar Gaddafi, ordenou estupros em massa e comprou estimulantes sexuais para que suas tropas estuprassem mulheres. Nesse mês, os Estados Unidos, Itália, Espanha, França, entre outros, reconheceram os rebeldes líbios como legítimos. Surgem novas propostas de acordo entre Gaddafi e rebeldes, entre elas que o filho do ditador organize uma eleição, mas rebeldes disseram que não confiam em um processo político organizado com ele no poder. Na foto, apoiadores de Gaddafi se reúnem em torno de seu retrato gigante na Praça Verde, em Trípoli

JULHO - Cerca de 1,2 milhão de pessoas fugiram da Líbia desde fevereiro, quando se iniciou o conflito armado entre as forças governamentais e os rebeldes. Muammar Gaddafi prometeu atacar "casas, escritórios e famílias" na Europa em retaliação aos ataques aéreos da Otan em seu país. Os rebeldes com postos em Misrata avançam cerca de 20 km para o oeste rumo à capital, Trípoli, onde está o reduto do ditador. Um raro encontro aconteceu entre autoridades dos EUA e representantes de Muammar Gaddafi para pressionar a renúncia do líder. Na foto, milhares de rebeldes protestam contra o ditador, em Misrata

AGOSTO, 1º a 21/08 - Além da crise do combustível que afeta a vida diária dos moradores de Trípoli há vários meses, a falta de energia elétrica e os cortes no fornecimento de água agravam o sofrimento dos habitantes da capital da Líbia no início do Ramadã, o mês sagrado para os muçulmanos. Os rebeldes líbios conseguem cercar Trípoli e a situação do ditador líbio ficou ainda mais complicada quando o ex-primeiro-ministro da Líbia, Abdessalam Jalloud, abandonou Trípoli e viajou para a Itália. O cerco a Gaddafi aumenta com a chegada rebelde à Trípoli.

AGOSTO, 21 a 23/08 - Resultado de um movimento ofensivo que começou no dia 20 de agosto, no dia 23 os rebeldes líbios tomam o quartel-general de Muammar Gaddafi em Trípoli, mais conhecido como complexo de Bab al Aziziya. Sem encontrar muita resistência, os combatentes entram nos edifícios do governo e saem de lá com documentos oficiais para provar a conquista. O ditador e seus filhos não são encontrados no local e os rebeldes ainda não declararam vitória, pois há focos de resistência contra os insurgentes em diversas partes da capital.

fonte: www.R7.com